Nú artístico - Dalmo de Oliveira

Girou o registro do chuveiro elétrico, deixou as gotas finas d’água gelada passar pelo seu couro cabeludo e desaguar no restante de seu corpo. A madrugada ainda começava. De olhos fechados, refletiu sobre tudo. Percebeu que ainda era nada. Um nada perto de tudo o que queria ser. Como alguém consegue vencer na vida? Por que alguns conseguiam e outros tantos não? Apoiou-se na parede cinza do banheiro alheio e respirou fundo. Tinha que parar de pensar assim, lutar ou aceitar – era o que todos diziam. Ele decidiu lutar, então.
Quem o vesse nas noites e madrugadas, pensaria que o que fazia era prazeroso. Nada – de novo, nada. Ruim a vida de quem fingi para viver. Por isso, ele lutava. Deixava-as felizes, isso é inegável; elas tremiam, sorriam, choravam, gemiam ou gritavam. Diziam que ele era tudo. No fundo, ele sabia que não era nada.
Vestiu-se, observando o corpo feminino desmaiado de prazer na cama. Lastimou sua conduta, mas mesmo assim pegou o dinheiro pago pelo seu serviço e saiu silenciosamente. A madrugada começava: havia tantas outras por aí, à sua espera. Continuaria a ser nada, mais uma vez.